A função social da tia do café

sábado, 30 de julho de 2011

Quando me formei escutei uma pergunta, tanto de meu pai como de minha mãe, que não gosto de ouvir até hoje: “Filho, porque você não faz um concurso público?”.
A função social da tia do café

O fato de odiar essa pergunta vem de uma vocação natural que tenho, e de muitos da mesma geração, pelo desafio. Repartições públicas são monótonas, chatas, não estimulam a criatividade, não desafiam os funcionários, não possuem metas agressivas e outros adjetivos vistos da ótica da Geração Y, seja esse conceito equivocado ou não. Mas em momento algum recrimino os porquês dos meus pais me fazerem essa pergunta até hoje. Eles (funcionários públicos) possuem uma estabilidade no emprego, não são afetados por crises globais ou locais e mantém um salário na média do mercado, quando não maior, mesmo que sem grandes aumentos ao longo da vida.

Antigamente as empresas privadas tinham um perfil semelhante, no que tange à continuidade do emprego quando comparamos com as empresas públicas. Quantos de nós conhecemos o pai daquele amigo que trabalhou anos como engenheiro da construtora Fulano LTDA, ou nosso tio aposentado como representante comercial da distribuidora Cicrano S.A. depois de uma vida inteira de dedicação? Pois o que antes era um mar calmo de ventos alísios soprando para o norte se tornou uma atmosfera tempestuosa, vez por outra semelhante a um maremoto, onde apenas os mais destemidos conseguem dobrar o Cabo da Boa Esperança da vida profissional. E são nesses mares agitados que muitos teimosos preferem colocar seu barco e velejar felizes da vida.
Infelizmente, aquele afeto, carinho ou até a mesmo paixão platônica que existia entre a empresa e o empregado deixou de existir. Primeiramente as empresas arremessaram aos cães a fidelidade para com seus empregados. Depois foi a vez de estes darem o troco e o que se veem hoje são relações de interesse mútuo onde um empregado que cometeu uma falha operacional é desligado sem serem levadas em consideração tantas outras vezes quando ele executou sua função além da sua capacidade. Há ainda o profissional que troca de empresa porque o PPL do ano foi abaixo do esperado quando, em anos anteriores, houve recordes na distribuição dos lucros.
Por vezes encontramos ilhas de bom convívio social dentro de uma corporação, o que faz com que seus componentes se mantenham atrelados à empresa rodeada de interesses puramente financeiros e chauvinistas. Trabalhei em uma empresa assim, e uma das poucas coisas que me mantiveram nela foram os conselhos na hora certa e o bom humor da ‘tia do café’, carinhosamente chamada por todos de dona Lourdinha. Consegui me manter na empresa por um bom tempo até surgir uma melhor proposta. Empresas com alta rotatividade, em sua maioria, se devem a essa falta de socialismo, espírito de união e de assistência pelo alto clero corporativo.
Um gordo salário mensal não sustenta um extenuante e às vezes irracional stress diário. Se as empresas quiserem a fidelidade que nossos pais deram as suas empresas no passado, ou mudam suas concepções de ambiente de trabalho com um foco mais humano, ou precisarão contratar muitas outras donas Lourdinhas.

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